Nome: Sueli Auxiliadora Santana Chaves

Idade: 42 anos

Tempo de Estudo da Língua: 5 anos

Narrativa coletada por Ana Paula Alves de Oliveira em abril de 2006

 

 

 

_Comecei a estudar espanhol por desejo. Ouvia a sonoridade da língua e fiquei encantada. Há muito tempo eu ouvi um ator falando um poema do Pablo Neruda em espanhol e aquele “sonido”, “la lengua” batendo... eu fiquei encantada. E comprei um livro do Almodóvar que tinha português numa página e espanhol do outro. E fiquei comparando e tentando... não conhecia nada de espanhol. Então eu ficava lendo a palavra em português e em espanhol pra ver qual fazia diferença...e foi muito interessante. Aí um  CD e as músicas, eu ouvia Herreras e (...) Luis Miguel... e ficava ouvindo.

            (...)Perto da minha casa, abriu uma faculdade, uma instituição que seria ensinado lá espanhol/português. Nunca tinha pensado em fazer um curso superior até então...Dava aula... tinha magistério, dava aula pra ensino fundamental, mas não tinha pensado ainda. Aí busquei a formação, fiz vestibular, passei, comecei e apaixonei. O primeiro período de espanhol foi dado por uma professora chamada Clarisse. Ela é muito rígida... chegou assim...querendo gramática... aí aquilo tudo foi me transformando e eu fui tomando gosto. Aí tive um professor de (...) espanhol instrumental, eu acho que ele é brasileiro, falava muito bem o espanhol e conseguiu transmitir pra nós alunos dele, que éramos a princípio 42 alunos mesclados,  depois só mulheres... mas ele tinha muito jeito pra ensinar o espanhol...e despertou... o material que ele levou... ele foi no ponto.... conseguiu dar a fome. Então nós fomos buscar o alimento, estávamos com fome de espanhol.

            Então foi muito bom...eu fiz o curso, nunca tive as melhores notas do curso não, mas porque eu gosto mais de ler com o meu próprio....

_ Você lia por gosto?

_ É... por puro prazer. Então aí eu li Quixote, Isabel Allende... lógico, são dois mundos diferentes mas eu tinha que buscar todo tipo.... Cervantes e Allende. Mas eu comecei a pegar, olhar tudo que era nesse idioma com outros olhos. Com o olho bem mais “confortador”... aí eu já não via nenhum defeito... muito interessante. Aí li Guevara, tudo que era do Che.

Aí eu propus ao reitor que estava buscando monitoria, ele tava dando (...) curso de espanhol gratuito só pra dar a fome pra que entrassem na faculdade depois. Tipo assim: eu não agüentava espanhol,  aí eu começo a fazer o curso, acho que é interessante, vou e faço o curso de letras. Mas eu como já estudante de letras, tava buscando como praticar. Como? “quem iria falar espanhol comigo?” “ia ficar falando sozinha, cantando?” Aí eu propus que a gente fizesse, levasse o recurso... não como um curso de idiomas... só que o idioma, a língua espanhola ficasse na vida deles de uma forma natural. Aí o que nós pensamos em fazer: eu assistia aos filmes que eu gostava, fazia uma sinopse, chagava na sala falava... primeiro, dava aquele pré, um gosto, um gostar de ver o filme.(...) Mostrava como era bom, fazia uma propaganda um anuncio, aí todo mundo queria assistir em espanhol. “mas ahhh professora! A gente não vai entender nada!” aí eu falava: “não, não vamos pensar só...  pensa na imagem, no som, aí caso não consigam entender o que tá sendo dito, (porque a imagem, ela é maravilhosa pra você entender), você vai ler”, aí eu colocava em português, porque também eu não ia poder fazer isso com eles né...de repente pôr tudo em espanhol, mas foram umas seis vezes, só traduzido pra português ouvindo em espanhol e aí eles começaram a pedir: “Vamos tirar a legenda?” Vamos ouvir, porque assim é muito melhor, ele ficam mais atentos. Então isso foi muito bom.

Aí teve dia que eu levei “película”, outro dia eu li uma poesia bonita, que eu gostava, aí eu fragmentava, dividia, fazíamos uma roda, cada um lia um pouquinho, e era bom porque a gente tinha muita liberdade...

_ E com isso você aprendia muito né?

_Nossa! eu aprendi mais que eles. Porque eu já tinha aquela base, a concepção de língua... já tava internalizado o gosto.

Então, quando nós estamos em grupos (...) eu tinha que buscar mais pra não cometer erros gritantes. Erros? Cometo. Mas (...) aquela postura de que sabe do professor, que o aluno pensa: “Você sabe”.(...) E o professor ta buscando, mostrando que sabe. Em momento nenhum o aluno vai falar (...) esbarrar com você e dizer assim:”você não sabe”. Então é muito bom porque quem aprende mais é o professor, nossa... buscar muito.

Aí o que eu fiz... fiz um projeto, pra ensinar. Eu dou aula numa escola pública de 1ª à 4ª. Aí eu fiquei pensando “por que não ensinar pra eles?” aí eu fiz um mini-projeto pra despertar o gosto... assim: cores, aquelas palavras que a criança escuta... Você vê que a mídia transforma tudo...coisas  que nunca chegariam na sua casa hoje chegam. Tem uma propaganda que fala assim: “Hablas espanhol?” e os meninos ficam querendo saber: “professora, é assim que fala espanhol?” “é com esse /θ/ é?”. Então eles acham engraçado. O Luxermburgo não foi pra Espanha? e  não foi criticado por conta do espanhol? Então isso tudo foi uma chamada pra eles. Aí eu pensei: “Vou levar esse gostinho pra eles, essa sementinha tem que ser plantada tão pequeninha”, mas na 5ª série já vai ser... até que eles cresçam já vai ser matéria obrigatória. Agora tem até uma lei né... dentro de cinco anos o Estado tem que já ter um programa de espanhol.

Aí aonde eu aprendi mais, que eu fui buscando, fui lendo, perguntei minha professora: (...) como posso fazer um curso, um planejamento, um projeto de “enseñanza del espanhol?” “¿Cómo puedo hacer llegar a los niños que no tienen, a veces ni tendrán oportunidad?” Ella habló: “Busque los cursos de inglês, haga como ellos hacen, empiece con los colores, después nombres de las frutas...va haciendo eso, después me traiga para ver.”

Yo hice, hablé, escribi, e levei à escola e a professora falou comigo que eles não sabem nem português...

Mas as estratégias que eu uso são essas: “películas”, estratégias de grupos, faço grupos em sala direto, círculos, dinâmicas, distribuo muito desenho, muita imagem... eu acho que a imagem o som.... é porque nós estamos competindo com a televisão, ta muito difícil ganhar essa briga. Eu fiz um trabalho em sala e distribuí uma tartaruguinha de brinquedo e todos os dias eles levavam a tartaruguinha pra casa (aí eu conto uma história enorme...é muito bonita essa prática) quando eles cegavam em casa, eles punham a tartaruguinha num lugar da casa e no outro dia chegavam contando pra mim como tinha sido o dia anterior. Onde estava a tartaruga em 90% das situações? Em cima da televisão. Qual o melhor lugar? Qual o lugar de honra da casa? Em cima da televisão. Eles estão de frente pra ela e a tartaruga em cima. Teve um caso que todo o mundo via a tartaruguinha era lá. Agora, teve casos de alguns que dormiram com ela, colocou na cama, no quarto, mas quase todos começavam a manhã assim: “levei e ela assistiu a novela comigo” “professora, eu tava dormindo vendo a novela, aí ela caiu”. Duas crianças puseram na bicicleta e foram andar e mais duas brincaram no quintal com elas.

_E o resto?

_Todos na televisão.